1 de fevereiro de 2018

Manoel Conceição: Sobrevivente do Brasil


Antes de fazer a passagem para o plano superior, o historiador Adalberto Franklin nos deixou talvez sua obra mais vigorosa. O livro "Manoel Conceição: sobrevivente do Brasil" (Ética Editora, 348 páginas) traz a biografia do líder camponês do interior do Maranhão, que junto com demais companheiros fundou vários sindicatos rurais e mostrou ser possível resistir as injustiças do latifúndio em plena ditadura militar.

Perseguido, preso e torturado, Manoel Conceição teve a perna amputada devido a sequelas de um tiro que levou em das umas tantas emboscadas que sofreu. Graças a intervenção do Papa Paulo 6° escapou para o exílio e foi morar  em Genebra, na Suíça onde seu depoimento ganhou o mundo e as páginas do livro "Cette terre à nous" da jornalista Ana Maria Galano, publicado na França.
("Esta terra é nossa" só seria publicado no Brasil em 1980, pela editora Vozes). 

A saga no livro de Adalberto Franklin, traz com riqueza de detalhes os primeiros contatos de Manoel com as injustiças sociais do campo, mais precisamente na região do Pindaré, onde homens e mulheres eram mortos constantemente pela ganância de grandes fazendeiros e a conivência do aparelho estatal. A polícia também era protagonista dos maus tratos sofridos pelos trabalhadores rurais.  O líder camponês começou organizando o sindicato de trabalhadores rurais no vale do Pindaré-Mirim, no Maranhão, posteriormente contribuiu na organização de entidades importantes no cenário nacional como a Central Única dos Trabalhadores – CUT, o Partido dos Trabalhadores – PT e o Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural – CENTRU.

A obra é fundamental para se conhecer o Maranhão profundo onde a conjuntura política da época é apresentada com o rigor detalhado e  personagens como José Sarney, governador do Maranhão, são revelados em toda a sua sordidez e contradições. Consta no livro a responsabilidade do velho oligarca no sofrimento de Manoel e a posterior tentativa de comprá-lo oferendo-lhe regalias. Manoel prontamente responde-lhe "Minha perna é minha classe" !

Adalberto certa vez disse-me que iria escrever a segunda parte do livro, dando detalhes sobre a época que Manoel morou fora do Brasil, onde viajou para várias partes do mundo, denunciando o regime civil-militar do Brasil e se encontrou com vários lideres socialistas. Sua casa era ponto de encontro de outros brasileiros, sindicalistas, intelectuais artistas, políticos. Germinava ali o que seria o então Partido dos Trabalhadores. Infelizmente corremos o risco de não termos esta segunda parte. O autor não teve tempo de publicar e o biografado em idade avançada já não guarda muito bem as lembranças. 

A saga de "Manoel Conceição: sobrevivente do Brasil" é um misto de narrativa histórica e drama realista envolventes. Poderia tranquilamente virar um grande longa-metragem de ação pelo ritmo que passa. Uma triste história como foi a de tantos outros brasileiros e maranhenses mais com um grande final para aqueles que acreditam na justiça. O legado de Manoel jamais será esquecido. Já seus algozes estão no lixo da história. 


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